Pesquisadores da UFPI e UFDPAR desenvolvem máscara respiratória reutilizável e de baixo custo para profissionais de saúde
Dentista Dayene Meneses em Parnaíba-PI - Foto Gelson Catatau
A pandemia do novo coronavírus provocou escassez de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) no Brasil e no mundo, pondo em risco a segurança de profissionais de saúde, que estão na linha de frente no tratamento de contaminados pela Covid-19. Pensando em oferecer uma solução viável e emergencial ao problema, um grupo de pesquisadores do Piauí em parceria com cientistas de outros estados, desenvolveu uma máscara respiratória de material biodegradável, de baixo custo, reutilizável e que pode ser produzida em impressoras 3D domésticas. A solução já começa a ser replicada em países como EUA, Portugal, Espanha, Itália e República Tcheca. No Piauí, as máscaras são doadas a profissionais de saúde da rede pública.
Prof. Dr. Alex Marinho, reitor da UFDPar - Foto: Gelson Catatau
A máscara é feita do bioplástico PLA, um material biodegradável, reciclável e ecofriendly, de uso comum em impressoras 3D. O biomaterial forma uma barreira física próxima à boca, evitando a disseminação das partículas virais por pessoas infectadas. Como filtros da máscara, são usados discos de algodão, de 58mm, facilmente encontrados a baixo custo em supermercados e farmácias. Segundo os pesquisadores, um mesmo filtro pode ser utilizado pelo profissional por um período de até 6-8 horas seguidas. A cada uso, basta higienizar a máscara com álcool em gel 70% ou água sanitária convencional, trocar o filtro e voltar a usar o EPI. Cerca de 150 profissionais voluntários participaram dos testes de ergonomia para avaliar o conforto e respirabilidade no uso do EPI.
Os testes laboratoriais da máscara foram feitos no Núcleo de Pesquisa em Biodiversidade e Biotecnologia (BIOTEC), da Universidade Federal do Delta do Parnaíba ( UFDPar). Após os testes de diversos materiais como filtros, chegou-se a resultados satisfatórios, alcançando a mesma eficácia das máscaras hospitalares N95, em falta no mercado, conforme explica a Biomédica Dra. Alyne Rodrigues.
Dra. Alyne Rodrigues de Araújo, Biomédica da UFDPar - Foto: Arquivo Pessoal
“Os testes consistiram em testes de penetração de aerossol, de saturação, de retenção total e também com nanopartículas, que tinham o tamanho aproximado do vírus. De todos os materiais que testamos, os que mais apresentaram resultados combatíveis com a máscara N95 e até melhores que a máscara cirúrgica, em alguns aspectos, foram o disco de algodão e o papel de filtro qualitativo, os dois sozinhos e a associação de ambos. Mas escolhemos o algodão pela facilidade de encontrar e pelas várias camadas que a trama do algodão tem. É como se uma camada de algodão fosse compensando a outra, exatamente o que a gente vê em microscópio analisando a N95, que possui várias camadas de celulose em espessuras diferentes.” , detalha a biomédica.
Tendo à frente a startup de Robótica TRON, a máscara é resultado do trabalho voluntário de profissionais e pesquisadores de áreas como Física, Farmácia, Enfermagem, Química, Engenharia e Biomedicina de universidades e centros de inovação de diversos estados como Sergipe, Goiás, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, formando uma rede colaborativa que se mobiliza para obter investimentos, imprimir os EPIs e fazer as máscaras chegarem a profissionais da saúde no Brasil e no mundo.
Prof. Dr. Gildário Lima, da UFDPAR, coordenador-geral do projeto da máscara - Foto Arquivo Pessoal
“A solução foi levada a outros estados e países por meio da comunicação do projeto a partir do site oficial, em que está documentada a pesquisa. Como é uma iniciativa, com documentação robusta, com a realização de vários testes, os pesquisadores e profissionais se sentem confiantes. Eles entram em contato conosco, tem acesso ao arquivo de impressão e começam a produzir e testar a máscara onde estão. A repercussão tem sido surpreendente, e ficamos felizes em colaborar com sociedade nesse momento tão difícil que estamos atravessando”, explica o Prof. Dr Gildário Lima, coordenador-geral da iniciativa, pesquisador da UFDPar, e um dos sócio-fundadores da startup desenvolvedora.
Estima-se que cada máscara tenha custo de produção entre R$ 5 e R$ 15. Para se ter uma ideia, uma impressora 3D amadora, é capaz de produzir 5 máscaras a cada 24 horas.
Profa. Dra. Maria das Graças Medeiros - Foto: Arquivo pessoal
Participante da iniciativa, a Profa. Dra. Maria das Graças Medeiros, docente da UFPI, explica que a proposta foi desenvolver um EPI de baixo custo e de fabricação viável no cenário de escassez de equipamentos e de material. “Começamos diante de uma necessidade muito grande de EPIs. Nos juntamos ao pesquisador Gildário Lima ( UFPDar), que estabeleceu parcerias e juntamos expertises para criar uma máscara que pudesse ser produzida em impressoras 3D e que apenas o filtro fosse descartável. Nosso grupo pensou em vários materiais, desde os mais sofisticados, como membranas de filtração, aos mais simples, como filtros de café, até chegarmos aos discos de algodão, muito conhecidos por serem usados para tirar maquiagem. Depois de vários testes até a escolha do filtro de algodão, fomos buscar a questão da regulação e como poderíamos produzir a máscara, alinhado à normativa recente da Anvisa”, explica a pesquisadora.
Prof. Dr. Lívio Cesar Cunha Nunes, da UFPI: "apelo ecológico da máscara é outro destaque do nosso trabalho"
Também representando a UFPI no time de pesquisadores, o Prof. Dr. Lívio Cesar Cunha Nunes, do Curso de Farmácia, destaca a importância do desenvolvimento de EPIs viáveis e que nao causem impacto ao meio ambiente. "Na busca de poder ser útil nesse momento de crise, ficamos honrados com o convite do prof. Gildário para compor o grupo nessa empreitada, pois já são dois modelos de máscara uma com filtro e outra do tipo face shield. A Delfi-TRON traz uma grande vantagem de ser biodegradável e também precisamos pensar em preservar o ambiente quando essa pandemia passar. O Prof. Gildário é um visionário e já está, incansavelmente, trabalhando no desenvolvimento de um respirador mecânico impresso em 3D. Aqui em Teresina, estamos trabalhado também na produção e distribuição de álcool a 70% na forma líquida e em gel", disse.
Primeiras doações no Piauí - Com patrocínios de instituições como Fiepi, Sesc Piauí e Minas Gerais, além de empresas, o grupo de pesquisadores está produzindo as primeiras 1000 máscaras e protetores faciais tipo Face Shield para doação, que estão sendo distribuídos às secretarias municipais de saúde de Cajueiro da Praia, Parnaíba, Campo Maior e Floriano. A iniciativa mantém uma vakinha online para arrecadar recursos e comprar mais impressoras 3D e material. O site para doar é www.vaka.me/950362.
Profissionais do Samu de Cajueiro da Praia-PI um dos primeiros a receberem doação da mascara - Foto: Arquivo Pessoal
Doação de 50 delfi-TRONs e face shields ao Hospital Estadual Dirceu Arcoverde - HEDA, em Parnaíba-PI - Foto: Gelson Catatau
Qualquer pessoa pode imprimir a máscara - Para multiplicar as impressões e doações, o projeto open-source busca novas parcerias com empresas que já trabalham com impressão 3D, lojas que vendem materiais de impressão e pessoas que possuem impressoras 3D em casa, para que se voluntariem a produzir a máscara em seus estados ou países. O acesso ao arquivo de impressão da máscara deve ser solicitado pelo site tron-edu.com/mascara.
Entre as instituições internacionais parceiras estão: Harvard Medical School, Tiradentes Institute e Massachusetts Institute of Technology, nos EUA; Universidade de Napoles-Itália; Universidade de Barcelona e Universidade de Granada, na Espanha; Universidade de Coimbra e Universidade do Minho, em Portugal; e a Czech Academy of Sciences – na República Tcheca.