UFPI adotou políticas de cotas na pós-graduação antes de obrigatoriedade do MEC
A Lei Federal N° 14.723, de 13 novembro de 2023, instituiu em todo o Brasil a obrigatoriedade de instituições de ensino superior federais implementarem a Política de Cotas no processo de ingresso de estudantes em Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu (referente às formações de Mestrado e Doutorado). A decisão implica que as universidades têm de equiparar de acordo com a realidade brasileira a proporção de estudantes consonante com os parâmetros de etnia (candidatos pretos, pardos, indígenas e quilombolas) e deficiências físicas, ou prioridade de vagas remanescentes para o público-alvo. Antecedendo a decisão do Governo Federal, no ano de 2021, a Universidade Federal do Piauí (UFPI), por meio da Resolução N° 98 de 2021, do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPEX), adotou cotas para ingresso em todos os programas de pós-graduação.
A Pró-Reitora de Ensino de Pós-Graduação da UFPI, professora Regilda Moreira-Araújo, uma das responsáveis pela elaboração e proposição da Resolução que instituiu em 2021 as cotas na pós-graduação ao CEPEX – UFPI, destaca que a adoção da política buscou inserir uma parcela da população ainda excluída do ambiente acadêmico em nível de pós-graduação e promover o acesso a qualificação por meio dos cursos de Mestrado e de Doutorado. “Poucas universidades tinham instituído a Resolução de Ações afirmativas para a Pós-Graduação e a UFPI foi uma das primeiras. Foi de extrema relevância, levando-se em consideração que a grande parcela dos alunos é composta por discentes em vulnerabilidade social ou econômica, portanto, estão dentro do público de ações afirmativas. É preciso promover a inclusão de indígenas, quilombolas, pretos, pardos e pessoas com deficiência, porque todos precisam ter acesso à formação de qualidade por meio da pós-graduação, o que irá alavancar melhores condições de renda, acesso e oportunidades de emprego, formação e divulgação do conhecimento científico crítico e modificador da realidade precária que muitos se encontram”, afirmou.
Pró-Reitora de Ensino de Pós-Graduação da UFPI, professora Regilda Moreira-Araújo
A Resolução aplicou nos Programas de Pós-Graduação da UFPI cotas de 20% das vagas para candidatos dentro do público étnico da política (negros, pardos e indígenas) e 10% das vagas para candidatos dentro do público de Pessoas Com Deficiência (PCD) nos processos seletivos dos Programas de Pós-Graduação Stricto sensu. Segundo a Pró-Reitora “deste 2021 tem aumentado o número de discentes que ingressam na pós-Graduação por meio das cotas, em nível de Mestrado, o que tem refletido na continuação da qualificação com o aumento expressivo nas seleções para 2023 e para 2024 de discentes cotistas para cursar Doutorado, possibilitado pela Resolução N° 98 de 2021”.
“Houve democratização do espaço acadêmico, possibilitou-se que mais pessoas ingressem e possam ter acesso à Universidade. Constata-se que, por meio dos editais que foram abertos, ingressou uma quantidade significativa de pessoas por meio das cotas, de modo a se observar daqui a alguns anos se essas transformações foram percebidas”, apontou o Coordenador dos Programas Stricto sensu da Pró-Reitoria de Pós-Graduação da UFPI, professor Francisco de Assis Nascimento.
Coordenador dos Programas de Pós-Graduação Strictu Sensu da UFPI, professor Francisco Nascimento
O histórico do sistema de cotas para estudantes da Pós-Graduação em todo o Brasil remete à 11 de maio de 2016, quando o Ministério da Educação (MEC) publica nesta data a Portaria Normativa de Nº 13, a qual sugeria (ainda não em tom de obrigatoriedade) que as instituições de ensino superior públicas trouxessem propostas de inclusão de candidatos no Mestrado e no Doutorado. O sistema de cotas é uma política de caráter afirmativo para pessoas de situações socioeconômicas vulneráveis que busca reparar historicamente o processo de exclusão dentro do sistema educacional brasileiro, de modo que busca agregar descendentes da exclusão racial estruturada a partir do período de colonização no Brasil (iniciado no século XIV) e dos mais de 300 anos de sistema escravista instituído durante o período colonial e imperial no país, assim como incluir pessoas excluídas pelas condições físicas, no caso de estudantes PCDs.
O sistema de cotas possibilitou o ingresso de Giovanna Carvalho Sousa Silva no doutorado do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas em 2024. A acadêmica enfatiza que a política busca pela integração social de grupos sociais marginalizados e pela diversidade de experiências na pós-graduação, o que, segundo ela, irá promover um enriquecimento dos conhecimentos produzidos neste ambiente. “O sistema de cotas foi crucial em minha vida, foi através dessa política que consegui entrar no doutorado e dar continuidade aos meus estudos em um ambiente acadêmico de excelência. Representou não apenas uma conquista pessoal, mas também uma forma de romper com as desigualdades e injustiças sociais”, disse.
Giovanna Carvalho ingressou no Doutorado em Ciências Farmacêuticas em 2024 através da Políticas de Cotas
Conforme pontua a Pró-Reitora “é imprescindível propiciar a permanência destes discentes na Universidade, pois não é suficiente só garantir o acesso, mas possibilitar que continuem sua formação, consigam concluir os trabalhos de Mestrado e de Doutorado e não desistam por falta de apoio financeiro, sendo necessária a ampliação das bolsas para a Pós-Graduação Stricto sensu, quer seja Demanda Social da CAPES, quer sejam de outros órgãos de fomento, como o CNPq e as FAPs”. A acadêmica Giovanna Carvalho foi também contemplada recentemente pelo programa de bolsas de Doutorado da UFPI, estando agora em processo de formalização do benefício. “Considero as bolsas de permanência fundamentais para a conclusão da pós-graduação, pois ajudam a garantir condições mínimas de subsistência para os estudantes, possibilitando o foco integral nos estudos e nas atividades acadêmicas, sem que a situação financeira seja uma barreira para a conclusão do curso”, destacou a estudante.
Após a obrigatoriedade da instituição de Cotas na Pós-Graduação Stricto sensu em 2023, Rayssa Maria de Sousa Silva ingressou no doutorado do Programa de Pós-graduação em Alimentos e Nutrição em março de 2024. A mestranda defende o sistema de cotas como uma política necessária à população brasileira enquanto reparador de desigualdades sociais diversas. “Acredito que, a curto prazo, as políticas de cotas irão proporcionar diminuição na desigualdade, principalmente por oportunizar o acesso ao conhecimento por pessoas pretas e pardas, que historicamente sofrem preconceito racial. Já a longo prazo, acredito que a partir dessas políticas de cotas, o ambiente acadêmico, incluindo discentes, docentes, técnicos, se transformará em um ambiente que realmente seja um recorte real da composição étnica da população brasileira”, afirmou.
A doutoranda em Nutrição Rayssa de Sousa também ingressou na pós-graduação através da Política de Cotas
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