As bolsistas de Produtividade em Pesquisa (PQ) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) recentemente ganharam o direito a um ano adicional quando tiverem filhos. Com a medida, o CNPq assegura condições mínimas para que as mães bolsistas não interrompam suas pesquisas e atende demanda das pesquisadoras e de grupos envolvidos no aumento da participação das mulheres nas ciências.
As bolsas concedidas pelo CNPq são um dos principais instrumentos de formação de recursos humanos e apoio à pesquisa na carreira de pesquisadores e não se caracterizam como vínculo empregatício, no qual inclui a licença maternidade remunerada de 120 dias como um benefício previdenciário, garantido na Constituição Brasileira.
No entanto, as mulheres bolsistas PQ estavam enfrentando prejuízos quando o parto ocorria dentro do período de concessão e tinham que diminuir ou interromper as atividades científicas, já que nesta modalidade a bolsa tem vigência de 3 ou 5 anos, sendo concedida ou prorrogada mediante avaliação da produção científica feita por comitês assessores. A medida, que agora abrange essas pesquisadoras, já estava implantada para as bolsistas de mestrado, doutorado e pós-doutorado.
Para a pesquisadora Márcia Barbosa, professora titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, bolsista de Produtividade em Pesquisa e presidente do Comitê Assessor de Física do CNPq, uma das barreiras que as mulheres cientistas enfrentam é conciliar carreira e maternidade. "Este ano adicional que o CNPq concede permitirá que as pesquisadoras recuperem o período menos produtivo em termos de artigos e possam continuar a carreira, ou seja, dá uma solução de continuidade. Tenho certeza que permitirá que fiquem no sistema pesquisadoras extremamente talentosas que darão contribuições fundamentais à ciência brasileira", ressalta Márcia Barbosa, que também defendeu e encaminhou formalmente ao CNPq o pedido de prorrogação da bolsa PQ.
Pesquisadora Prof.ª Márcia Barbosa
Na semana em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, Márcia Barbosa concedeu uma entrevista ao Portal CNPq em que apresentou suas reflexões sobre o papel da cientista e cenário para as mulheres pesquisadoras.
CNPq - Como a senhora vê a medida do CNPq que prorroga a Bolsa PQ para aquelas pesquisadoras que tiveram partos durante a vigência da bolsa? O que a levou a formalizar a solicitação de prorrogação da bolsa ao CNPq?
Esta solicitação foi elaborada pela Comissão de Relações de Gênero da Sociedade Brasileira de Física da qual sou membro. É um resultado de uma série de reflexões sobre o tema. Nas diversas conferências e debates internacionais dos quais participei como coordenadora do Working Group in Women in Physics da International Union of Pure and Applied Physics, observamos que uma das barreiras que mulheres cientistas enfrentam é conciliar carreira e maternidade. Esta, portanto, é uma questão universal.
A bolsa de Produtividade em Pesquisa tem uma estrutura onde o crescimento do(a) pesquisador(a) se dá preferencialmente de uma forma continuada. A interrupção provocada por ter um ano menos produtivo não é prejudicial somente neste momento, mas se propaga ao longo de toda a carreira.
CNPq - A senhora concluiu sua graduação na década de 80 e aos 30 anos já tinha o seu primeiro pós-doutorado em Física. Para uma mulher, como era ingressar na carreira científica? Havia muitas companheiras nesta época?
Na década de oitenta éramos 10% meninas ingressando no curso. Na minha formatura era a única mulher. As barreiras naquela época como agora são sutis. Em discussões científicas ou administrativas em grupo era esperado que eu fizesse as atas, reports. Diversas vezes em eventos, quando mais jovem e menos conhecida, era confundida com a secretária do evento, a recepcionista, ou pior, a esposa de alguém.
Felizmente apesar de sermos poucas, sempre fomos muito unidas na percepção de que havia barreiras, algumas transparentes. Estas minhas colegas de trajetória são um modelo de paixão pela ciência e de perseverança.
CNPq - Como foi enfrentar uma carreira eminentemente até então com predominância masculina?
A carreira científica é muito estimulante e desafiadora. Ser uma minoria significa que haverá obstáculos que serei a primeira a enfrentar, cabe a mim identificá-los e buscar políticas que os removam.
CNPq - Como se vê como a única integrante feminina no Comitê Assessor de Física e Astronomia e presidente do mesmo?
Coordenar um conjunto de pessoas brilhantes sempre é muito difícil. Espero ter conseguido ser uma "harmonizadora" de ideias que, por vezes, tem que ter uma mão de ferro com uma luva de pelica.
CNPq - Como a senhora avalia o aumento do número de mulheres que optam hoje pela carreira científica, principalmente entre as faixas mais jovens?
Fico contente ao observar que há um crescimento de mulheres no meio científico, particularmente entre as jovens. Este aumento, no entanto, se dá de forma mais importante nas áreas humanas, biológicas, saúde e na química. Ainda é tímido nas outras áreas de exatas, informática e engenharias. Na informática em particular, tem se observado uma redução se compararmos com o início da informática no Brasil. Temos que identificar ações no sentido de atrair meninas para as exatas, particularmente para áreas de amplo mercado de trabalho como engenharia e informática.
CNPq - Que iniciativas podem ser destacadas como importantes para estimular a presença de mulheres na ciência?
Visibilidade. É fundamental o Brasil conhecer seus cientistas e em particular suas cientistas. Precisamos mostrar que o fazer ciência é algo para qualquer indivíduo que goste de ciência, eliminando os estereótipos que associam fazer ciência com um perfil antissocial.
Assessoria de Comunicação Social do CNPq
Foto: Arquivo Pessoal da Entrevistada
(Texto original publicado no dia 08 de março de 2013 e disponível em: www.cnpq.br)