O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento que afeta a comunicação, a interação e o comportamento, resultando em uma variedade de desafios sensoriais que podem influenciar a percepção e a resposta do indivíduo ao ambiente ao seu redor. As manifestações comportamentais dessa condição podem incluir também interesses restritos e padrões de conduta repetitivos.
Logo do Núcleo de Acessibilidade da UFPI (NAU)
É fundamental que as instituições acadêmicas procurem tornar seus ambientes inclusivos e acessíveis, através de políticas que deem visibilidade aos estudantes que possuem o TEA, determinada deficiência e com altas habilidades/superdotação, a fim de que sejam acolhidos. Tendo em vista o bem-estar de toda a comunidade acadêmica, a Universidade Federal do Piauí (UFPI), conta com o Núcleo de Acessibilidade (NAU), que auxilia no desenvolvimento pessoal e no processo de aprendizagem desses estudantes. O projeto possui profissionais capacitadas, como: psicóloga, pedagoga e assistentes sociais, as quais foram fundamentais para o aprendizado do Gabriel Peixoto, discente do Centro de Tecnologia (CT), que faz parte do espectro autista-asperger.
Acácia Peixoto, mãe de Gabriel Peixoto.
Acácia Peixoto, mãe de Gabriel Peixoto, além de participar ativamente do “Projeto Flor de Mandacaru”, iniciativa do NAU voltada para as mães dos estudantes público-alvo da educação especial da UFPI, é também uma presença constante ao lado de seu filho no Laboratório de Acessibilidade e Inclusão (LACI). Esse espaço dispõe de recursos acessíveis e tecnologias assistivas para as pessoas com deficiência, a fim de promover a educação inclusiva. O local é gerenciado pelo NAU e se encontra dentro da Biblioteca Comunitária Jornalista Carlos Castello Branco, da UFPI.
Acácia discorre sobre alguns dos benefícios que o NAU, em conjunto com o LACI, proporciona. “O Núcleo tem 44 mães de autistas que estão na universidade. Nós fazemos reuniões e discutimos várias questões no LACI, para garantir o bem-estar acadêmico dos nossos filhos. Esse espaço tornou-se nosso ponto de encontro habitual, porque tem tudo que os nossos filhos precisam, incluindo uma sala de estudos bem equipada, com uma sala de estudos bem equipada, com fones de ouvidos, computadores e muitos outros materiais”, diz.
Acácia Peixoto e seu filho, Gabriel Peixoto, na exposição “Arquitetando as cores do autismo”.
Ela compartilha sobre os seus primeiros sentimentos ao ver que seu filho passou para o curso que tanto desejava fazer. “Alegria e satisfação foram os meus sentimentos predominantes ao saber que Gabriel conseguiu uma vaga no tão sonhado curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPI. Além disso, saber que ele tem colegas de turma tão acolhedores, especialmente o Rafael, seu tutor e grande amigo, me deixa ainda mais feliz.”, afirma.
Cards promovendo as exposições feitas por Gabriel Peixoto.
Gabriel Peixoto, estudante de Arquitetura e Urbanismo do CT, tem sido um defensor visível do Transtorno do Espectro Autista, expressando seu talento artístico principalmente para a comunidade acadêmica. Ele foi autor de duas exposições, “Arquitetando as cores do autismo”, apresentada no Museu de Arqueologia, e “Amostra fotográfica: Arquitetura e Geometria Sagrada”, exibida na Biblioteca Comunitária Jornalista Carlos Castello Branco.
Gabriel Peixoto, discente de Arquitetura e Urbanismo do Centro de Tecnologia.
Gabriel fala sobre seu desejo em ser arquiteto. “Para mim, fazer Arquitetura é uma experiência gratificante. Desde o momento em que decidi me tornar arquiteto, quando descobri que podia desenhar e que me chamava atenção aqueles prédios da zona leste, perto do Jóquei, algo despertou em mim. Quando meus parentes me levavam para olhar aquelas casas de taipa seguradas por madeira, isso também despertou meu interesse. Eu estava acostumado a ver construções feitas de tijolos e de outros materiais, mas observar uma casa de taipa segurada com madeira, me deu a impressão de que qualquer pessoa podia fazer aquilo. Então vendo isso, eu decidi saber mais e descobri a profissão de arquiteto”, conta.
“Na universidade, os docentes UFPI são maravilhosos, principalmente o Haziel, o Martin, o Renan, a Nadja. Mas é necessário que todos os professores procurem estudar mais sobre o espectro autista, porque ainda há muita desinformação sobre esse assunto. Os funcionários também são muito cordiais, sempre procuram nos ajudar, seja os que trabalham na cantina ou em outros locais são muito educados e querem o nosso bem. Eles são pessoas que transformaram a minha vida”, complementa Gabriel.
Felipe Matheus com seus pais, Antônia Luzemir Martins e Rozeilton Martins.
O Centro de Tecnologia possui também estudantes com TEA de outros cursos, como é o caso de Felipe Matheus, aluno do curso de Engenharia de Materiais do CT. Antonia Luzemir Martins, mãe de Felipe, diagnosticado com nível 2 de autismo, discorre acerca do processo de entrada do seu filho na UFPI. “Foi muito bom e tranquilo. Em relação aos colegas, meu filho foi e continua sendo bem acolhido. A maioria dos professores o acolhem bem e acredito que também com os outros alunos autistas. Durante esses três anos de curso, duas professoras adaptaram conteúdos, atividades e provas. As adaptações que elas fizeram com certeza são de aplaudir e de fazer brilhar os olhos”, diz.
Felipe Matheus, discente do curso de Engenharia de Materiais.
Felipe Matheus, também conta sobre a importância dos seus colegas de turma e das suas docentes do curso de Engenharia de Materiais do CT. “É um curso muito difícil, mas com ajuda principalmente das professoras, Tatianny e Renata, e do auxílio dos colegas, entendi muitas coisas”, fala.
Primeira vaga de estacionamento da UFPI exclusiva para pessoas com autismo.
O CT reconhece a importância da inclusão e da acessibilidade para todos os seus membros, incluindo aqueles que possuem o TEA. Nesse sentido, empenha-se em criar um ambiente acolhedor e adaptado às necessidades individuais de cada estudante, implementando práticas que promovem a valorização da diversidade neurocognitiva. Como parte desse compromisso, no ano passado, o Centro de Tecnologia implementou a primeira vaga de estacionamento da UFPI exclusiva para pessoas com Transtorno do Espectro Autista.
Além disso, os professores do CT estão engajados em apoiar os estudantes com TEA, buscando capacitar-se para promover um processo de aprendizagem efetivo e facilitar a inclusão. Por isso, é de suma importância que haja a produção de materiais adaptados, adequados às necessidades específicas dos alunos com espectro autista. Dois exemplos notáveis dessa ação são os docentes Haziel Pereira e Renata Barbosa.
Haziel Pereira, docente do curso de Arquitetura e Urbanismo.
Haziel Pereira, professor doutorando do Departamento de Construção Civil e Arquitetura, compartilha sua experiência ao ministrar aulas para o aluno Gabriel Peixoto. “Foi uma experiência muito enriquecedora para mim como pessoa e como profissional da educação. Ao mesmo tempo também foi um desafio, como professor, conduzir a disciplina de Geometria Descritiva, ministrando o conteúdo e tentando ser o mais claro possível para Gabriel, levando em conta suas particularidades no processo de aprendizado”, diz.
Professor Haziel auxiliando o aluno, Gabriel Peixoto, no final da aula de Geometria Descritiva.
“O plano de ensino foi adaptado para atender às dificuldades da turma e de Gabriel na compreensão da ‘visão espacial’ em Geometria Descritiva. Então, ao longo das aulas, eu tentei deixar Gabriel o mais à vontade possível para expressar suas dúvidas, inclusive o estimulando a ir até o quadro e desenhar nele, mostrando as inquietações e incertezas que ele possuía nos exercícios passados em sala e nas próprias aulas teóricas. Tentei, na medida do possível, passar um tempo a mais com Gabriel, no horário da aula, auxiliando-o na representação dos objetos tridimensionais e bidimensionais, mostrando exemplos do dia a dia. Eu percebi que ele conseguia assimilar melhor quando eram objetos da vida real, mas utilizando as técnicas de representação de Geometria Descritiva”, complementa Haziel.
Renata Barbosa, docente do curso de Engenharia de Materiais.
Renata Barbosa, professora doutora do Curso de Engenharia de Materiais, membra permanente do Programa de Pós-graduação em Ciência e Engenharia dos Materiais e coordenadora do Laboratório de Polímeros e Materiais Conjugados (LAPCON), ministrou aulas ao aluno Felipe Matheus. A docente explica como as atividades avaliativas adaptadas eram feitas.
Prova da disciplina de Processamento de Materiais Poliméricos.
“Todas as avaliações foram conduzidas em dias diferentes dos planejados para a turma, em função da necessidade de um ambiente para maior concentração. Consequentemente, as provas foram elaboradas de duas maneiras. A primeira delas foram as perguntas escritas de forma objetiva e com a escolha da alternativa correta, todas as questões foram elaboradas com desenhos e imagens, para ajudar na analogia dos fundamentos da disciplina. Já a segunda foi no formato de ‘prova oral’ composta por questionamentos curtos e diretos sobre os assuntos realizados. Independentemente do tipo de avaliação, sempre foram elaborados questionários previamente, contendo perguntas e respostas, para ajudar nos estudos prévios às avaliações”, finaliza Renata.